Contos da cidade -

Uma vida artística? Seus pais não demonstravam desprezo, nem simpatia. Indiferença também não. Era receio. Nem eles confiavam direito nela.
O calor a deixava mais estressada, e o cansaço a fazia pesar, seus passos eram mais longos e demorados, a música já não surtia mais efeito em seu pensamento, agora queria achar um lugar onde realmente se encontrasse.
Os homens que viam-na passando, ou viravam para admirar seus poderes, e ela já não perdia mais seu tempo odiando-os, ou simplesmente viam que ela não estava nem aí para nada, então eles também não perdiam seu tempo.
O dia ia acabando com um sol muito claro, marcado por poucas nuvens no céu, o que a deixou contente quando subia a rua depois do mercado, que quase nunca pegava, justamente por conta de comentários masculinos sobre si.
Mas porque receio de uma vida artística? É uma vida como qualquer outra não é? Tem que ir atrás, trabalhar muito, e claro, na nossa sociedade, ganhar pouco por isso, você nunca ganhar seu valor verdadeiro.
Sim, era receio, ela sentia receio de tudo.
Do seu futuro logo depois dos estudos. Do seu futuro artístico. Isso que agora era o mais importante, até mesmo mais que família, amigos, namorado, comida, lar. Seu futuro. Não sabia mais nada sobre ele, sendo que havia pouquíssimo tempo, eram amigos íntimos!
Será que ela havia mascarado havia desde sempre esse receio? Dizendo: Ah, o que eu devo me importar agora são as provas finais, depois a gente vê o resto. Pois o resto estava chegando, e ela estava perdida.





Perdida aonde? Perdida do quê? Mas também, o que faria agora? Sentaria e esperaria um sinal do céu? Mas a fé sempre foi cega, logo ela não precisaria de um sinal.
Chegava em casa, cansada, esbaforida. Queria comer alguma coisa, sair daquela realidade o quanto mais cedo pudesse.
Sentou-se à mesa da cozinha, e pegou leite e pão para comer. Demorou. Lembrou de tudo o que tinha pensado neste caminho de volta. Era um sentimento de perda de tempo. Uma desilusão que se transforma em água corporal. Não suor. Sofrimento em lágrimas. Tinha sofrido uma enorme desilusão.

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